quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Bispos ameaçados por quadrilhas de exploração sexual


Por lutarem contra a exploração sexual de crianças e adolescentes,
 religiosos do interior do Pará viraram alvo de quadrilhas que
aliciam as meninas.

Nos últimos anos, as denúncias de exploração sexual de crianças e
adolescentes no Brasil têm se multiplicado. Como resposta, o poder público, as
organizações não governamentais e os religiosos se uniram em campanhas contra as
quadrilhas. Esse embate, no entanto, não é fácil e em pelo menos um recanto do País
 enfrentar o problema representa sério risco de vida: o interior do Pará. Ali, em pequenas
cidades onde a pobreza torna mais fácil o trabalho dos aliciadores de menores e os
 matadores de aluguel cedem sua mão de obra por poucos reais, os principais
porta-vozes da luta contra as quadrilhas são bispos católicos. Instalados há décadas na
região, os religiosos sabem muito bem que quem atravessa no caminho dos criminosos vira
alvo. No episódio mais recente, há quatro meses, o bispo de Marajó, dom José Luiz Ascona,
71 anos, foi avisado pela Polícia Federal que bandidos articulavam uma ação contra ele.
 Apesar disso, dispensa a segurança que os agentes lhe oferecem. “Que direito eu tenho de
 colocar em risco um pai de família?”, questiona o bispo. “Diante da morte, que pode chegar a
qualquer momento, Deus me dá coragem.” Além de Ascona, também os bispos de
Abaetetuba, dom Flávio Giovenale, e Altamira, dom Erwin Krautler, lutam contra a exploração
 sexual e sofrem ameaças por isso.

Como se não bastasse o crime, a faixa etária das crianças que sofrem abusos ou se prostituem
tem baixado cada vez mais. Em um dos últimos episódios, descobriu-se uma menina de 8 anos que
 sofria violência sexual. Algumas vezes, as crianças e adolescentes trocam dinheiro por sexo com
 a aprovação das próprias famílias, que geralmente sofrem com a pobreza. “Há pais que sabem e
outros que fingem não saber, pois se beneficiam da renda que as adolescentes levam para casa”,
 conta dom Flávio Giovenale, 57 anos, bispo de Abaetetuba, que fica a 60 quilômetros de Belém.
Na cidade, formada por várias ilhas fluviais, o tráfego descontrolado de barcos favorece o tráfico
de pessoas. Muitas jovens são levadas para o Amapá e depois cruzam a fronteira para o Suriname
e para a Guiana, onde são submetidas à prostituição e ao trabalho escravo. Dom Giovenale não
tem dúvida quanto à periculosidade das quadrilhas. “Aqueles que promovem a exploração sexual
 e o tráfico de pessoas são os mesmos que traficam drogas e armas”, diz. Apesar disso, segue
o padrão de seu colega de Marajó e, mesmo denunciando constantemente a ação desses criminosos,
 não lança mão de segurança. “Não gostaria de morrer, mas não acho que seja o caso de andar
cercado de agentes”, argumenta. A última ameaça clara contra ele aconteceu no ano passado.

Open in new windowDos três, o bispo de Altamira é o único
que recorre a policiais para manter longe
 os bandidos. Isso acontece porque
dom Erwin Krautler, 72 anos, sempre fez
questão de marcar sua posição em
várias questões candentes. Ele
denunciou conflitos agrários ao lado de
 Dorothy Stang, foi um dos primeiros a se
 posicionar contra a construção da usina
de Belo Monte e fez, há alguns anos, a
 acusação de que crianças e adolescentes
 eram vítimas de exploração sexual por
 parte de políticos importantes da região.
 Isso lhe rendeu ameaças de todos os
tipos que continuam até hoje e o obrigam
a lançar mão de quatro policiais para
garantir sua integridade. “Meus inimigos
têm desejo de enriquecimento rápido e não
duvido que não hesitariam em passar por
cima do meu cadáver”, diz ele.

A luta dos bispos tem rendido frutos. Nos
 últimos anos, a ação da polícia se tornou
mais frequente e vários setores da
sociedade paraense estão se engajando no
combate. Na última semana, os
empresários do ramo hoteleiro do Estado criaram um código de conduta para evitar o chamado
 turismo sexual, prática que pode aumentar bastante durante a realização da Copa de 2014. Outra
iniciativa importante vem do governo federal. A Secretaria de Direitos Humanos prepara um pacote
 de ações para prevenir a exploração sexual em áreas como Belo Monte, já que normalmente a
migração intensa de operários em obras de grande porte resulta no aumento da prostituição.
 “Nossa atitude é totalmente preventiva, estamos planejando ações de fortalecimento dos conselhos
 tutelares e há uma operação já organizada para a região”, adiantou a ministra Maria do Rosário.
 A SDH é responsável pelo Disque 100, número que recebe reclamações de violações de
 direitos humanos e principalmente de exploração sexual. A ideia é boa, mas no Pará ainda não pegou.
 “É difícil fazer divulgação desse tipo de serviço aqui. Em muitos lugares do interior o telefone
 simplesmente não funciona”, explica dom Flávio Giovenale.

Como solução para o problema, os religiosos sugerem duas providências: prevenção e repressão.
 A primeira parte ficaria por conta das políticas de educação e criação de emprego e renda.
A segunda, por conta da polícia. “De qualquer forma, notamos que as pessoas estão mais
atentas ao problema. Antes muitos fingiam que não viam”, afirma dom Ascona. Para ele, esse é
o primeiro estágio para a solução: “Sem conhecer a verdadeira dimensão do problema, não há
como remediá-lo.”

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Fonte: Revista IstoÉ

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